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Mostrando postagens de julho, 2009

Cores e dores

Cansava a sua beleza. Cansava a beleza de Linda aquele mantra masculino para sua paciência, Não pude evitar, você é muito bonita e sensual... Do que um homem é capaz para seduzir uma mulher. As verdades momentâneas ganham requinte de longevidade e as gentilezas superam os limites do tempo e do espaço. Mais tarde, aquele sorriso de satisfação anula as vozes da véspera, dispersas entre ontens e até mais. Numa noite despretensiosa, a cerveja descia refrescando seu cansaço, e também iludia um divertimento entre os percursos dos dias úteis. A música dançava entre amigos que conversavam em pé, circundando uma mesa para apoio dos copos. Já era o terceiro naquela noite tentando lhe faturar e ela não suportava mais, com a imagem de casa adentrando no recinto. Preciso ir ao banheiro. Ai, que fila é essa? A mulher na porta cedeu seu lugar na fila para mim, disse Linda a seus amigos quando voltou para o grupo. Com doses realistas de gentileza, sem importunar o limite de espaço entre um ser e

Eu sempre quis

Sabia que as palavras me motivam mais que os números. Que a humanidade me interessa mais que os bichos. Que as questões sociais abrem mais brechas que as individuais. Eu sempre quis. Primeiro, quis pigmentar o planeta com todas as cores que faltavam. Equilibrar os contrastes de luz em alguns países. Chamar a atenção das pessoas para os tons escuros, abafados pelos claros. Ou para os claros, em detrimento dos escuros. Eu sempre quis. Quis iniciar a mudança na minha casa. Escalar o topo do meu mundo e fincar a bandeira da vida. Canalizei a paixão para a rapidez dos dedos no teclado e para a curiosidade sobre os não-costumes. Mas as paixões duram o sopro de sua tosse. A pulsão partiu com todos os meus quereres na mala. E o mundo saiu do roteiro da minha viagem. A intensidade das emoções, última parada. Perdi o brilho das realizações. Esqueci de buscar. Deixei de querer. Até que outras letras me olharam disponíveis. Seus propósitos eram maiores que os meus. Influenciavam positivam

O santo

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Com apenas 19 anos o mundo mal descortinara à sua frente. Perspectivas provincianas de uma vida pacata projetaram a imagem de Santo Antônio, uma estátua de madeira que inaugurava dias melhores. Foi o primeiro que Paloma ganhou, porque é preciso ganhar de alguém para dar certo. Assim que começou a reza, as recitações progrediram na mesma proporção de seus desejos. As palavras surgiam ininterruptas, amaldiçoavam aquele casamento, ao mesmo tempo glorificavam o artefato, que ganhou local arejado, mel no pires aos pés, perfume, flores e velas. Bom dia, Santo Antônio. Vou te tratar muito bem, só quero casar com o homem que Eu escolher. Os anos intercalaram ressentimentos saudosos de uma vida que esperava ter. Aos 26, destacava-se na multidão, não por sua exuberância, mas por se sentir só. E a figura de Santo Antônio invadiu sua mente. Colocou um pouco d’água num copo, e a efígie nem teve chance de argumentar: foi afogada de cabeça para baixo. Dia 12 de junho, Dia dos Namorados,

Hoje

Hoje o que me compraz é o orgulho por suas vitórias. A decepção por suas derrotas me desfaz. Hoje posso dizer mesmo sem saber se posso deixar lá perdido Que meu passado Independe do meu futuro Sou hoje não mais ex mas a estranha sim, talvez E os seus cacoetes também mudaram por sua vez. Por sua. Hoje você não jaz na superfície das memórias de Tempos atrás. O que hoje aqui está Já não se pode traduzir. Reluzem no espectro meus hojes. Raquel Abrantes

Certos signos

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Imaginava a seqüência a ser escrita, sutilmente entre os ditos e os não-ditos, naquela gratificante permuta de vivências, confidências entregues à delicia de libertar vazios... Certos signos remetem a assuntos já destoados de nossas vozes, cruzadas na sintonia do olhar adiante, de transladar o ocorrido pela escolha do vento de amanhã. A página seguinte carrega afinidades casuais, simulando a dança das folhas cadentes de suas origens arbóreas. Como a leveza de uma pena colorida, que acaricia arrancando risadas pertinentes ao diálogo das retóricas. Da mesma forma, uma brisa solfejada solta a imaginação que nos insere, nos reparte e deixa reverberar. E das referências compartilhadas, a patente se encanta por uma orquestra de alusões, principiando o uníssono de aliterações bem articuladas. Mesmo sem avistar a sombra dos traços labiais... efeitos de luz das expressões suprimidas... recria-se a latência onírica. Escalada de pretensões até o alto de nossos sonhos, poderosos ajudantes

Bermuda

E ele retomou seu lugar depois de alguns meses. Abigail tinha terminado um namoro transitório na sexta-feira. Fabrício chegou três dias depois... Como se nunca houvesse partido. Ele perguntou sobre a sua bermuda. Estava lá; lavada, passada e guardada na gaveta. Abigail olhava para seu amor e para a bermuda. Estava feliz com o retorno do dono, proprietário também da sensação que ela sempre esperava. E aquela risadinha no canto da boca recordava ironicamente que a bermuda fora preenchida por outro, amassada por outro, arrancada de outro, por todo o tempo em que Fabrício a abandonara. A bermuda não caía tão bem em Julio, mas ele se apaixonou intensamente por Abigail e faria qualquer coisa para manter o relacionamento. Até mesmo ignorar sua história com Fabrício. Inicialmente, algumas fagulhas estimularam o casal, com surpresas, declarações e a hipótese de ficarem juntos. Só que ainda não estava resolvido. Não para Abigail. Ela se contorcia ao ouvir o nome... Fabrício... Sua espinha