Insensibilidade
Visão aérea de infrutíferos campos compelidos ao reinante descaso em toda a sua impessoalidade. Acrobacias inúteis no perímetro do horizonte passam despercebidas no transcorrer de hábitos inertes. Costumes insensatos trancafiavam o vírus do sentimento, nunca antes contagiado. Em sua mais pura inutilidade, o ar raro efeito tem sobre a consciência da respiração. Diafragma dilatado e contraído em movimentos involuntários. Como o pôr-do-sol. Quereres enigmáticos divagam aleatoriamente no oceano de teorias desintegradas. Da cruz retiro a dor, que tampouco tangencia os sentidos encobertos pela capa da alma, vestimenta rudimentar criada pelos alfaiates da resignação, nos moldes das grades carcerárias das emoções. Soslaios se revezam entre o esquerdo e o direito, atrás e adiante, norte e sul, sem bússola para consultar. Imaginando uma rota de fuga do inóspito reino da insensibilidade. Abstrações tornam-se o último refúgio da sanidade, ao lado da insistente neurose disseminada. Indiferente a possibilidades, cercada pelo vazio da exaltação ao duvidoso, cera derretida escorreu do lume originando sinais de vida, picos na pulsação, pontos altos que deslizaram pelas covas de um sorriso denunciador. Eventuais flechas lançadas para delimitar espaços dimensionais. Guardiã do inefável, rabisquei trilhas no mapa transcendente de mim mesma, seguindo o rastro dos instintos abissais. Sobrepujei as maquetes da imposição, tramei escavações soturnas, como um inocente condenado à pena de morte. Estradas e cruzamentos descortinaram progressivamente em meio à paisagem, desobstruindo veredas pulsionais em avalanches avassaladoras de empirismo. O sol amanheceu em sensações, sereno como a noite seguinte, devastador como a próxima, até o precipício das vozes ecoadas nas vidraças do existir.
Raquel Abrantes
Aqui o Sol não amanheceu. Embrulhado pelo cinzento das nuvens, o dia trouxe ao regaço o pôr-do-sol de ontem, igual fadiga, os mesmos espaços por ver, luz escura. O espírito, queixoso, passou a persiana, recolou-se ao corpo incapaz de sem ele viver. A alma, essa, pena lá fora.
ResponderExcluirUm abraço deste lado do mar.
Belas palavras, surrealista.
ResponderExcluirSeus 'instintos abissais' são primos-irmãos das minhas veredaspulsionais. Assim fusionados vamos reinventando palavras, formas, modas, juntando destroços, recriando possibilidades. Adorei que minhas veredas tenham vindo passear por aqui. São suas!
ResponderExcluirBjus
Quão belas são as suas profundezas, amiga... (no sentido literário, claro) Adorei!
ResponderExcluirBjs,
Lu
Se toda forma de ver a "Insensibilidade" através de seus sentidos e sentimentos sensíveis a vida seria um grande por-do-sol sem fazer jus a seu "título". Te amo linda! Como sempre D +.
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