Quais seriam as palavras?

Entrei distraidamente naquela visão. O som e as cores de uma respiração agitada, mal-humorada, arrancaram meu ar abruptamente. Exercendo papel de destaque perante o resto dos mortais, ela esbanjava a certeza de não ser enganada, na simplicidade e na juventude de movimentos determinados. Detinha conscientemente o poder sobre quem a olhasse.

A carta continuou em minhas mãos trêmulas e a silhueta me encarava desdenhosamente... até mover o rosto, consentindo minha participação no futebol de mesa. Me aproximei imediatamente. Honrado estava ali em pé, enquanto a rapidez dos braços dela no jogo incitavam... Incitavam a abertura refletora entre duas ondas perfeitas. A inocente maldade de esconder a bola entre os lábios... e depois atirá-la, liberando desprezo. Traduzia a benção da qual precisava para minha absolvição.

Virou-se e seguiu em direção ao bar sem desviar a atenção concedida a seus deveres. Segurava com firmeza os copos atingidos pela correnteza da água da bica. Fui incapaz de emitir qualquer ruído. Sentei de frente para ela e me mantive contemplativo. Ela não pôde traçar o prognóstico de mais um, dentre os muitos que já devem ter abusado de sua simpatia.

Perguntei seu nome. Foi a nossa primeira conversa. Mas a garantia do diálogo será um poema capaz de descrever a doença que ela me transmitiu em apenas dez minutos, e da qual não quero me curar jamais. Sim! Estou dentro de seus cabelos enquanto pronuncio as palavras penetrantes em seu coração; mas quais seriam as palavras?


Raquel Abrantes

(inspirado em O Carteiro e o Poeta)
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